domingo, 10 de novembro de 2013

Sobre o nada


                Essa crônica é sobre o nada. Nada a ser escrito. Nada a ser dito. Isso acontece até mesmo com quem fala mais que a boca e pensa mais que o próprio cérebro. Defectível cérebro, é claro. Mas uma máquina incessante. Isso acontece. O nada. Acontece também com quem palpita até na vida da diarista. Com a devida permissão, com certeza. Ou nem tanto. Ou quase nada. Mas não é verdade que sempre temos a solução para os problemas dos outros? Portanto, dar conselhos se o filho da empregada deve ou não fazer o enem, é nada. Um pouco mais que nada. Talvez. Nada é sempre relativo.
                Pronto! O nada rapidamente ganhou corpo. Virou tema de reflexão. É impressionante como a máxima de viver em sociedade, que o ser humano é um ser social e blá, blá, blá, nos faz aptos a interagir com nossos iguais de maneira invasiva. E quem disse que precisa pedir? Quem foi que perguntou? Nos metemos mesmo. E o mais engraçado é que temos a chave do sucesso. Da porta dos outros. O roteiro da vida do outro é facinho de traçar. Por que resolvemos tudo dos outros? Os outros. Dos outros. Para os outros.
                Até nos assuntos mais prosaicos, sabemos mais que nosso semelhante. Repare como sabemos qual o melhor cardápio, a melhor viagem, a melhor marca de xampu. Do remédio para a frieira ao conserto da TV. Só sei que tudo sei, ou sabemos. Quando se trata de logística então, doutores. Já aconteceu de estar de carona com alguém e indicarmos qual o melhor caminho a seguir. O navegador é melhor que o motorista, quase sempre. Se o tema é livro, pimba! Temos a melhor indicação! Filme? É só dizer o gênero. Sempre temos uma vasta experiência. Anos luz na frente de quem aparecer pela frente.
                O palpite é certeiro. A opinião é contundente. O exemplo é pertinente e o resultado desconcertante: resolvemos o seu problema! Simples assim! Pode por uma placa indicando o ofício. Sempre saberemos o que fazer com a aflição alheia. O amigo angustiado bate em nossa casa e abrimos a porta da esperança. E de lá vem o passo a passo, o faz assim ou assado, o vai ou racha e o tim tim por tim tim. Exatamente como uma receita. Mais você. Louro José? No caso mais pra loura palpiteira.
                Em bom latim, o nome disso é dono da razão. Ou dona. Não interessa muito qual gênero. Muito menos o número e o grau, porque é sempre num grau! O proprietário da verdade é aquele que conhece o caminho das pedras e da razão. E sempre tem razão. Qualquer semelhança com o divino não é mera coincidência. Afinal, somos feitos à imagem e semelhança do próprio. Portanto, somos o cara. Temos poder.
                Tá, mas então por que este poder não está presente para resolvermos nossa vida? Onde estão nossos super poderes nessa hora? E os conselhos perfeitos? E as decisões acertadas? Conosco, o buraco não só é bem mais embaixo, como o fundo dá na China. Porque definitivamente nossos problemas não são o foco. O olhar é no vizinho, claro. Ajudar o atormentado é muito mais prazeroso, digo, generoso, do que olhar nosso umbigo! O ser humano é especial, mas esse dom só é capaz de ser exercido diante do espelho. Com outro reflexo. Do outro.
                Temos muita pretensão, prepotência e onipotência. E poder superior em determinar, interferir e invadir. Também dom para nos achar e nos sentir. Sempre os sabichões e elevados. Na máxima potência. E assim caminha a humanidade. Bom seria se fosse calçada nas sandálias da humildade. E com os olhos em nós mesmos.

Um comentário:

  1. Oi amiga, hoje não tenho nada para dizer, pois já tá repetitivo eu dizer que adorei já li faz tempo e hoje abri de novo com a expectativa de ler no novo e cadê? ?.... estou curiosa ? Um grande beijo Giovana.

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